junho 2, 2014 | Nenhum Comentário |
O GOVERNO FEDERAL, A POLÍTICA DE GESTÃO DE RESÍDUOS E AS AÇÕES DE VALORIZAÇÃO DOS CATADORES DE MATERIAIS RECICLÁVEIS.
A prioridade da inclusão e de promoção da cidadania dos catadores tem sido um dos pontos centrais da política governamental, nos últimos 10 (dez) anos, com a criação do Comitê Interministerial de Inclusão Social e Econômica dos Catadores e Materiais Recicláveis (CIISC). Nesta trajetória, a corresponsabilidade com os gestores e a sociedade – como o fim dos lixões e a implantação da Política Nacional de Gestão de Resíduos (PNRS) – Lei 12305/2010 – têm dominado a agenda pública dos compromissos dos municípios, dos estados e da União. Em atuação desde 2003, o CIISC, órgão da Secretaria Geral da Presidência da República (SGPR), tem papel relevante no debate e encaminhamentos de ações integradas para a efetivação das políticas e programas socioambientais em todo território nacional.
A coordenadora do CIISC Daniela Gomes Metello (foto) conversou, em entrevista exclusiva, com o jornalista e assessor de comunicação do Insea Antônio Coquito, sobre o trabalho do Comitê Interministerial, a importância do trabalho dos catadores, o fim dos lixões e as deliberações da IV Conferência Nacional de Meio Ambiente. Classificado por Daniela como seriíssimo, o panorama dos cerca de 2.000 (dois) mil lixões, ainda existentes no Brasil, é um problema ambiental. Mas, muito mais, trata-se de um desafio de um dívida social com milhares de cidadãos brasileiros. Daniela afirma que “ o fim dos lixões em 2014 não é questão de se acreditar – é o prazo para cumprir o que a lei determina.”
Diante dos debates sobre sustentabilidade no Brasil, Daniela é categórica na afirmativa “não acredito no desenvolvimento sustentável sem a inclusão dos catadores”. E arremata “agora que os municípios necessitam pela força da lei, formalizar suas políticas, não podem deixar esses agentes de fora do processo. Seria uma grande injustiça”.
INSEA: Que balanço pode ser feito dos 10 (dez) anos de trabalhos do Comitê Interministerial de Inclusão Social e Econômica dos Catadores e Materiais Recicláveis (CIISC) nas intervenções pela inclusão dos catadores de materiais recicláveis?
DANIELA METELLO: Desde 2003, o Governo Federal como um todo teve papel fundamental em colocar a questão dos resíduos e a inclusão de catadores na “ordem do dia”. O CIISC, que é formado por 24 órgãos do Governo Federal, teve participação fundamental em inúmeras ações e articulações para que a pauta de catadores estivesse presente nas políticas públicas de diversos órgãos. Hoje são políticas de inclusão social, de geração de trabalho e renda, de acesso à saúde e educação, de infraestrutura, de desenvolvimento econômico e de meio ambiente. Todas dialogam diretamente com o setor e de forma articulada por meio do CIISC e de seus 8 (oito) grupos executivos.
INSEA: No período citado, com a criação do CIISC, quais as conquistas e/ou mudanças que vem promovendo a inclusão dos catadores?
DANIELA METELLO: Nos últimos cinco anos, o Governo Federal investiu mais de 450 milhões de reais em estruturação de cooperativas e associações de catadores. A maior parte das cooperativas e associações existentes no país conta ou já contou com apoio do Governo Federal. Estamos construindo um modelo de inclusão de catadores como prestadores de serviço da PNRS. Avançamos em muitos aspectos: nas normativas, na criação de programas e ações, na priorização deste público em diversas políticas públicas, no desenho de como esta inclusão deve ser feita em âmbito local. Tudo em diálogo direto com catadores e catadores de materiais recicláveis, em especial, por meio do MNCR.
INSEA: Quais são as áreas foco do CIISC no fomento à organização dos catadores? Como as ações e projetos se articulam?
DANIELA METELLO: Temos programas e projetos específicos para catadores, como é o caso do Pró-Catador e do CATAFORTE, que fomentam infraestrutura, assessoramento técnico e capacitação específicos. Há outros que são para a população de baixa renda como um todo e que fazemos recortes específicos para atuar com catadores de materiais recicláveis como o Programa Bolsa Família e o Programa de Educação de Jovens e Adultos, que colocaram catadores de materiais recicláveis como público prioritário. O desafio é fazer estas ações, muitas vezes não articuladas, encontrarem-se nos estados e municípios, já que quem executa diretamente não é o Governo Federal. Para isto, buscamos incentivar formação de comitês, como o CIISC, para facilitar esta integração.
INSEA: Qual a importância do protagonismo dos catadores para o desenvolvimento sustentável?
DANIELA METELLO: Não acredito no desenvolvimento sustentável sem a inclusão de catadores. Os principais aspectos do desenvolvimento sustentável são o equilíbrio entre as questões social, ambiental e econômica. O que vemos, frequentemente, é a supervalorização da questão econômica. A questão com menos visibilidade é a social. Infelizmente já vimos algumas prefeituras encerrando atividades nos lixões sem fazer nenhuma ação junto aos catadores, que tiravam dali o seu sustento. Isso com certeza não é desenvolvimento sustentável. O modelo que desenhamos, em conjunto com os catadores, diz respeito a incluí-los de forma que deixem de serem pessoas às margem da sociedade para serem prestadores de serviço público – de coleta seletiva – sendo remunerados para tal. Deste modo, atingiremos o equilíbrio entre as vertentes econômica, ambiental e social do desenvolvimento. Até hoje, o que vemos é que quem tem contribuído, no Brasil, para a diminuição da destinação inadequada de resíduos recicláveis são os catadores. Graças ao trabalho desses homens e mulheres que não temos hoje uma situação ambiental pior país. Portanto, agora que os municípios necessitam, pela força da lei, formalizar este processo, não podem deixar estes agentes de fora. É uma grande injustiça.
INSEA: Levando em conta que os problemas e suas soluções estão nos municípios, como o governo federal incentiva as gestões municipais para uma postura proativa diante das questões dos resíduos sólidos? Como deve ser a relação governo municipal e governo federal para os avanços nas Políticas de Resíduos?
DANIELA METELLO: Os municípios são os titulares do serviço de limpeza pública, portanto a atuação direta necessita ser dos gestores municipais. O Governo Federal ajudou a construir a PNRS com inclusão de catadores, criou programas com recurso disponível para ação junto a este público, elaborou material orientativo, mas somente conseguimos agir em parceria com o poder público local. Esta tem sido a orientação das nossas ações.
INSEA: Como desencadear e fortalecer um trabalho integrado (governo, empresas e sociedade) para a ampliação e efetivação de políticas que promovam a coleta seletiva nas cidades e a implantação das Políticas Municipais de Gestão de Resíduos (PMGRS)?
DANIELA METELLO: Este é o desenho que estamos tentando fazer, pois todos estes entes e instituições estão implicados pela PNRS e possuem responsabilidades junto aos catadores. A questão é que não existe forma única, pois cada localidade possui suas peculiaridades. O que fizemos foi fazer os desenhos gerais dos programas, que podem ser adaptados às realidades locais. Um exemplo disso é o CATAFORTE – Negócios Sustentáveis em Redes Solidárias, que lançamos em julho de 2013. No edital, demos as diretrizes, as orientações, em seguida, cada rede irá fazer o seu Plano de Negócios que orientará suas ações e os investimentos do Governo Federal, obedecendo às diretrizes que formulamos adaptado à sua realidade.
INSEA: As conferências de meio ambiente pautaram o debate na gestão de resíduos e valorização do trabalho dos catadores. Que análise a senhora faz dos encaminhamentos da Conferência Nacional?
DANIELA METELLO: A IV Conferência Nacional de Meio Ambiente foi um espaço fundamental de diálogo entre sociedade e governos para a implementação da PNRS. Os catadores tiveram presença marcante em todas as etapas (municipais, estaduais e nacional). Esta participação se refletiu nas 60 (sessenta) ações aprovadas na etapa nacional. Assim como na PNRS, a inclusão de catadores está intensamente presente neste documento final. Os estados e municípios devem levar em consideração toda a construção que foi feita localmente, nas etapas municipais e estaduais, para elaborarem seus planos implementarem, de fato, a PNRS.
INSEA: O governo acredita no fim dos lixões até 2014? Qual o quadro da realidade brasileira hoje?
DANIELA METELLO: Não é questão de acreditar. É o que a lei determina, e estamos trabalhando com este prazo. A realidade brasileira é complexa. Certamente, a existência de lixões a céu aberto no país é um dos nossos principais problemas ambientais, aliado a questões sociais seriíssimas. Ainda temos oficialmente mais de 2000 (dois mil) lixões em atividade no país, com milhares de catadores e catadoras trabalhando nestes locais absolutamente inadequados.
A dedicação e empenho dessas instituições, tornaram possíveis a produção e continuidade dos projetos desenvolvidos pelo INSEA.